Paulo Batista Gomes

Paulo Batista Gomes

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Crise contemporânea e as transformações na produção capitalista

Crise contemporânea e as transformações na produção capitalista
Ana Elizabete Mota
Professora Convidada da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE1
Crise contemporânea e as transformações na produção capitalista
Introdução
 Este  texto  trata  da  crise  contemporânea  e  das  transformações  na  produção
capitalista,  entendidos  como  processos  que  determinam  as  mudanças  societárias  em
curso. Objetiva‐se discorrer sobre o alcance e o significado das transformações sofridas
na  esfera  da  produção,  desde  os  finais  dos  anos  70  do  século  XX,  destacando  seus
impactos no processo de acumulação capitalista, na gestão do trabalho  e  nos  modos  de
ser  e  viver  da  classe  trabalhadora.  Seu  conteúdo  está  estruturado  em  três  partes:
inicialmente,  ressalta‐se  a  dimensão  histórica  das  crises,  qualificando‐as  como
constitutivas  do  modo  de  produção  capitalista  e  da  sua  dinâmica  restauradora;  em
seguida,  destacam‐se  as  particularidades  da  crise  que  se  iniciou  no  final  dos  anos  70,
assim como os mecanismos utilizados pelo capital para o seu enfrentamento, pautados
na reestruturação produtiva, na mundialização financeira, nos mecanismos de gestão do
trabalho e nas estratégias de construção da hegemonia do grande capital; por fim, serão
indicadas  as  principais  implicações  dessas  transformações  no  mundo  do  trabalho  e  na
organização  política  dos  trabalhadores,  como  parte  ofensiva  do  capital  para  construir
uma cultura e uma sociabilidade compatíveis com os seus interesses atuais. 
1 As crises na dinâmica da acumulação capitalista
Para  compreender  as  mudanças  na  dinâmica  do  capitalismo,  é  necessário
reconhecer  o  significado  histórico  das  crises  no  seu  desenvolvimento.    Sejam  elas
qualificadas como crises econômicas1
,  como  o  fez  Marx  no  Livro  III  de O Capital  e  em
cuja tradição se perfilam autores como Rubin2
, Altvater3
  e Mandel4
, sejam elas também

1
  Na  investigação  de  Marx,  a  explicação  das  crises  está  relacionada  com  a  lei  tendencial  da  queda  das  taxas  de  lucro,  expressão
concreta das contradições do modo capitalista de produção e cuja equação pode ser sinteticamente resumida nos seguintes termos: a
produção da mais‐valia (quantidade de trabalho excedente materializado  em  mercadorias  e  extorquido  no  processo  de  trabalho)  é
apenas  o  primeiro  ato  do  processo  produtivo.  O  segundo  ato  é  a  venda dessas mercadorias que contém mais‐valia. Como não são
idênticas  as  condições  de  produção  da  mais‐valia  com  as  da  sua  realização,  a  possibilidade  de  descompassos  entre  esses  dois
momentos  cria  as  bases  objetivas  para  o  surgimento  de  crises.  Para  uma  primeira  aproximação  ao  tema,  sugerimos  a  leitura  de
Cultura da Crise e Seguridade Social (MOTA,  1995),  especialmente  a  Introdução  e  o  Capítulo  I  e  de  Economia Política: uma
introdução crítica (NETTO; BRAZ, 2006), Capítulo 7.
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 Rubin (1980, p. 31) afirma que as crises ocorrem porque “o processo de produção material, por um lado, e o sistema de relações de
produção  entre  as  unidades  econômicas  [...],  por  outro,  não  estão ajustados um ao outro de  antemão (grifos nossos). Eles devem concebidas  como  crises  orgânicas,  nas  quais  adquire  destaque  a  dimensão    política,
seguindo a análise gramsciana
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,    fato  é  que  elas  são  inelimináveis  e  indicam  o  quanto  é
instável  o desenvolvimento capitalista.
 
Segundo  Rubin,  as  crises  são  “hiatos  dentro  do  processo  de  reprodução  social”
(1980,  p.  31).  Através  delas  o  capital  se  recicla,  reorganizando  suas  estratégias  de
produção e reprodução social. Pode‐se dizer que as crises econômicas são inerentes ao
desenvolvimento do capitalismo e que, diante dos esquemas de reprodução ampliada do
capital, a emergência delas é uma tendência sempre presente (MOTA, 1995, p. 37).
  
As  crises  expressam  um  desequilíbrio  entre  a  produção  e  o  consumo,
comprometendo a realização do capital, ou seja, a transformação da mais‐valia em lucro,
processo  que  só  se  realiza  mediante  a  venda  das  mercadorias  capitalisticamente
produzidas.  Em  outras  palavras,  quando  são  produzidas  mais  mercadorias  do  que  a
população pode comprar, o processo de acumulação é afetado, uma vez que estoques de
mais‐valia  não  asseguram  o  fim  capitalista.  Para  isso,  não  basta  produzir  mercadorias,
estas  precisam  ser  transformadas  em  dinheiro  para,  rapidamente,  retornarem  ao
incessante  processo  de  acumulação  do  capital:  produção/circulação/consumo.  As

ajustar‐se  em  cada  etapa,  em  cada  uma  das  transações  em  que  se  divide  formalmente  a  vida  econômica”  (A Teoria Marxista do
Valor.  São  Paulo:  Brasiliense,  1980).  Essa  colocação,  devidamente  atualizada  (o  texto  é  dos  anos  1920)  expõe  com  clareza  o
imperativo  da  centralização  e  concentração  do  capital  que  se  expressam  atualmente  nas  fusões  patrimoniais,  na  organização  da
produção, como é o caso do estoque zero de mercadorias porque a produção passa a depender da demanda instalada, ou seja, da sua
venda antecipada.
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 Em dois ensaios publicados no v. 8 da Coleção História do Marxismo organizada por Hobsbawm, o cientista político alemão Elmar
Altvater enfoca as polêmicas em torno do tema das crises, destacando as suas dimensões econômicas e políticas e argumentando
sobre  a  impossibilidade  de  operar  tematizações  sobre  as  crises,  exclusivamente,  com  base  na  teoria  econômica  (ALTVATER,  E.  A
crise de 1929 e o debate sobre a teoria da crise. In: E. J. Hobsbawm (Org.) História do marxismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989,
v. 8, p. 79‐133).
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 Em A Crise do Capital, Mandel faz uma incursão histórica sobre as crises capitalistas, destacando suas características e seu caráter
cíclico,  argumentando  pela  necessidade  de  distinguir  os  fenômenos  da  crise,  suas  causas mais  profundas  e  sua  função  no  quadro da
lógica  imanente  do  modo  de  produção  capitalista  (MANDEL,  E.  A crise do capital: os fatos e sua interpretação marxista.  São
Paulo/Campinas: Ensaio/Unicamp, 1990. Cap. XXV).
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  Gramsci  adota  a  concepção  marxiana  das  crises  como  contradições  inerentes  ao  modo  de  produção  capitalista;  todavia,  é  no
tratamento  da  relação  entre  crise  econômica  e  crise  política  que  reside  a  originalidade  do  seu  pensamento.  Para  ele,  as  crises
conômicas  criam  um  terreno  favorável  à  difusão  de  determinadas  maneiras  de  pensar,  de  formular  e  resolver  as  questões  que
nvolvem todo o curso da vida estatal (GRAMSCI, A. Cadernos do Cárcere. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2000. v. 2 e 3).
e
eexpressões  mais  emblemáticas  das  crises  são  as  reduções  de  operações  comerciais,
acúmulo  de  mercadorias  estocadas,  redução  ou  paralisação  da  produção,  falências,
queda  de  preços  e  salários,  crescimento  desmesurado  do  desemprego  e
empobrecimento generalizado dos trabalhadores. Suas causas podem ser diversas, tais
como a anarquia da produção, a concorrência intercapitalista, com a consequente queda
tendencial da taxa de lucro, o subconsumo de massa, ou, ainda, podem ser potenciadas
por algum incidente econômico ou geopolítico.
3
 
Longe de serem naturais, as crises revelam as contradições do modo de produção
capitalista,  entre  elas,  a  sua  contradição  fundamental,  a  produção  socializada  e  a
apropriação  privada  da  riqueza,  também  reproduzindo  e  criando  outras  contradições
como  as  existentes  entre:  1)  a  racionalidade  da  produção  em  cada  empresa  e  a
irracionalidade do conjunto da produção e dos mercados capitalistas; 2) a maximização
dos  lucros  de  cada  corporação  empresarial  e  suas  refrações  na  concorrência,
ocasionando  a  tendência  à  queda  da  taxa  de  lucros;  3)  o  crescimento  da  produção  de
mercadorias e a estagnação ou redução da capacidade de consumo. 
Expondo  sobre  o  tema,  Netto  e  Braz  (2006,  p.  162)  afirmam  que  “as  crises  são
funcionais  ao  modo  de  produção  capitalista,  constituindo‐se  num  mecanismo  que
determina  a  restauração  das  condições  de  acumulação,  sempre  em  níveis  mais
complexos e instáveis, assegurando, assim, a sua continuidade”. 
Isso  significa  que  as  crises  não  ocasionam,  mecanicamente,  um  colapso  do
capitalismo.  Elas  deflagram  um  período  histórico  de  acirramento  das  contradições
fundamentais  do  modo  capitalista  de  produção  que  afetam  sobremaneira  o  ambiente
político  e  as  relações  de  força  entre  as  classes.  Por  ocasião  das  crises,  deflagra‐se  um
processo  no  qual  mudanças  significativas  ocorrem,  sejam  elas  no  interior  da  ordem,
sejam em direção a um processo revolucionário, dependendo das condições objetivas e
das forças sociais em confronto. A análise de Gramsci sobre o enfrentamento da crise de
1929,  exposta  no  célebre  texto Americanismo e Fordismo, é  central  para  entender  o
lugar  da  luta  de  classes  no  enfrentamento  das  crises,  donde  a  estratégia  revoluçãopassiva, como mecanismo para obtenção do consenso de classes em face das mudanças
realizadas  nos  processos  de  produção,  na  ação  estatal  e  nos  aparelhos  privados  de
hegemonia. 
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A  dinâmica  crise‐restauração  incide  nas  relações  sociais  e  implica  o
redirecionamento  da  intervenção  do  Estado.  Este,  por  sua  vez,  redefine  seus
Segundo Braga (2003, p. 217), em conjunturas de crise, 
a  principal  tarefa  das  classes  dominantes  passa  a  ser  a  de  erigir
contratendências  à queda da  taxa de  lucro. Nesse processo  devem
intensificar  os  métodos  de  trabalho,  modificar  as  formas  de  vida
operária e, principalmente, engendrar as bases políticas e sociais
de uma iniciativa que permita às classes dominantes tornar seus
interesses particulares em universais, isto é, válidos para todas as
classes. 
Trata‐se  de  um  meio  de  atualização  da  hegemonia  das  classes  dominantes  que
atinge  substantivamente  a  dinâmica  da  reprodução  social.  Do  ponto  de  vista  objetivo,
este movimento materializa‐se na criação de novas formas de produção de mercadorias,
mediante a racionalização do trabalho vivo pelo uso da ciência e tecnologia, regido pela
implementação  de  novos  métodos  de  gestão  do  trabalho  que  permite  às  firmas  o
aumento da produtividade e a redução dos custos de produção. 
Vale  salientar  que  os  impactos  das  crises  apresentam‐se  diferenciados  para  os
trabalhadores  e  os  capitalistas.  Para  os  capitalistas,  trata‐se  do  seu  poder  ameaçado;
para  os  trabalhadores,  da  submissão  intensificada.  Estes  últimos  são  frontalmente
penalizados na sua materialidade e subjetividade posto que afetados pelas condições do
mercado  de  trabalho,  com o  aumento do  desemprego,  as perdas  salariais, o crescimento
do  exército  industrial  de  reserva  e  o  enfraquecimento  das  suas  lutas  e  capacidade
organizativa.  mecanismos  legais  e  institucionais  de  regulação  da  produção  material  e  da  gestão  da
força de trabalho, instituindo renovadas formas de intervenção relativas aos sistemas de
proteção social, à legislação trabalhista e sindical, além daquelas diretamente vinculadas
à política econômica. Nesse contexto, se redefinem as relações entre Estado, sociedade e
mercado,  determinando  medidas  de  ajustes  econômicos  e  de  reformas  e  contra‐
reformas sociais, que continuem garantindo a acumulação capitalista, em conformidade
com as particularidades de cada formação social. 
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2 As particularidades da crise contemporânea e da restauração capitalista  
Os  anos  que  se  seguiram  ao  período  de  reconstrução  do  segundo  pós‐guerra,
estendendo‐se  até  os  anos  70,  nos  países  centrais,  foram  marcados  por  uma  fase  de
expansão  do  capitalismo,  caracterizada  por  altas  taxas  de  crescimento  econômico,
ampliação  de  empregos  e  salários  e  uma  forte  intervenção  do  Estado.  Este  período  foi
definido  como fordista­keynesiano  (HARVEY,  1995),  em  função  da  articulação  orgânica
entre  ação  estatal  e  gestão  da  produção,  vindo  a  configurar  uma onda longa expansiva,
nos  termos  de  Mandel  (1990).  Suas  características  foram  uma  intensa  centralização,
concentração  e  expansão  de  capitais,  cujo  desenvolvimento  das  forças  produtivas,
marcado por avanços tecnológicos, permitiu o aumento da produtividade do trabalho e
da  produção  de  mercadorias,  mediante  a  internacionalização  da  produção  e  a
redefinição  da  divisão  internacional  do  trabalho  (MANDEL,  1992).  Para  tanto,  foram
decisivos o amparo de fatores políticos, tais como:
 ‐  A  intervenção  do  Estado  que,  no  lastro  das  políticas  keynesianas,  criou
mecanismos  estatais  voltados  para  a  reprodução  ampliada  dos  trabalhadores,
socializando com o patronato parte dos custos de reprodução da força de trabalho. 
‐  A  construção  do  pacto  fordista‐keynesiano  (BIHR,1998),  marcado  pelas
mobilizações  sindicais  e  partidárias  dos  trabalhadores  que,  em  torno de reivindicações
sociais  legítimas,  pressionaram  a  incorporação,  pelo  capital,  do  atendimento  de  parte das  suas  necessidades  sociais,  operando  mudanças  nas  legislações  trabalhistas  e  nas
medidas de proteção social. 
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esses serviços públicos tinham objetivos bem claros: a) responder
as  reivindicações  dos  fortes  movimentos  operários  que  se
insurgiam na época; b) assumir os custos de reprodução da força
de  trabalho  antes  pagos  exclusivamente  com  os  salários  dos
próprios  trabalhadores;  c)  oferecer  alternativas  de  fundos  de
reserva  públicos  disponíveis  para  serem  investidos  em
empreendimentos  privados  dos  capitalistas  (principalmente  na
 
Essa conjunção de fatores foi responsável pela constituição do Welfare State, que se
tornou um dos principais pilares de sustentação institucional daquela fase expansiva do
capitalismo,  ao  integrar  à  sua  dinâmica  econômica  parte  das  demandas  operárias  por
melhores condições de vida e trabalho. 
A incorporação dessas demandas se fez através da alocação de fundos públicos na
constituição de políticas econômicas e sociais, o que favoreceu  a  ampliação do  consumo
por  parte  dos  trabalhadores:  ao  tempo  em  que  desmercantilizava  o  atendimento  de
algumas  das  necessidades  sociais  através  de  salários  indiretos,  via  políticas  sociais
públicas, a ação estatal permitia a liberação de salários reais  e  o  consequente  aumento
da  demanda  por  consumo  de  mercadorias,  criando  as  condições  para  o  surgimento  da
produção e do consumo em massa, típicos do regime fordista de produção. 
Estava  posta  a  equação  subjacente  ao  chamado  pacto  fordista‐keynesiano, ou seja,
a incorporação das demandas trabalhistas, aumento da produção e do consumo operário
e  estabelecimento  de  uma  relação  negociada  entre  Estado,  capital  e  trabalho,  como
expressão  concreta  de  ideologias  que  defendiam  a  possibilidade  de  compatibilizar
capitalismo, bem‐estar e democracia. 
Segundo Maranhão (2006), produção  e  compra  de  bens  de  capital  que  impulsionaram  várias
inovações  tecnológicas);  d)  liberar  parte  do  salário  dos
trabalhadores  para  serem  gastos  com  bens  duráveis,
principalmente  automóveis,  que  nesta  época  se  transformam  na
mola de expansão da acumulação do capital; e) e, finalmente, mas
não menos importante, oferecer barreiras ideológicas à expansão
do  socialismo  do  Leste  que,  nesta  época,  se  coloca  como  grande
meaça à sociedade capitalista.  
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A  plena  incorporação  das  economias  periféricas  ao  processo  de  reprodução
ampliada do capital ocorreu nos anos 70 do século XX, quando os países então chamados
subdesenvolvidos transformam‐se em campo de absorção de investimentos produtivos.
A seus Estados nacionais coube a continuidade – embora com novas características – do
papel  de  indutores  do  desenvolvimento  econômico,  propiciando  uma  base  produtiva
a
Esses  propósitos,  alcançados  em  alguns  países  europeus,  naquela  fase  de
desenvolvimento,  permitiram  alguns  ganhos  materiais  para  aqueles  trabalhadores.
Todavia, enquanto os países centrais garantiam a reprodução do crescimento econômico
com  desenvolvimento  social,  a  periferia  mundial  assistia  a  defesa  do
desenvolvimentismo  como  meio  de  integração  desses  países  à  ordem  econômica
mundial.  Concomitantemente  crescia  a  economia  capitalista,  assegurando  a  sua
virtuosidade entre os anos 40 e 70 do século XX. 
Diferente da trajetória que determinou o Welfare, o desenvolvimentismo no Brasil
foi  resultado  de  um  processo  de  modernização  conservadora  que  consolidou  a
industrialização  e  o  crescimento  econômico,  mas  que  não  redistribuiu  os  resultados
dessa  expansão  com  a  maioria  da  população  trabalhadora.  Merece,  portanto,  ser
ressaltada  a  inexistência  da  experiência  welfareana no  Brasil  apesar  da  criação  de
algumas  políticas  de  proteção  social,  instituídas  a  partir  dos  anos  40,  mas  somente
redefinidas nos anos 80, quando se instituem as bases formais e legais do que poderia
ser um Estado de Bem‐Estar Social, na Constituição de 1988 (MOTA, 2006). integrada  às  necessidades  dos  oligopólios  internacionais,  graças  ao  apelo  ao  crédito
externo para o financiamento daquela base e da sua expansão. 
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Qualificado  por  muitos  como  um  período  em  que  o  trabalho  perdeu  a  sua
centralidade,  fato  é  que  os  anos  que  se  seguiram  à  década  de  80  são  palco  de  um
processo  de  restauração  capitalista,  assentada  num  duplo  movimento: 1) a redefinição
das bases da economia‐mundo através da reestruturação produtiva  e  das  mudanças  no
Essa  situação  reverte‐se  na  década  seguinte,  quando  se  inicia  a  crise  da  dívida
externa, obrigando tais países, sistematicamente, a exportar capitais para o pagamento
dos empréstimos recebidos. Não por acaso, em tal período, o mundo capitalista revela os
sintomas de uma crise de acumulação, obrigando os países desenvolvidos a redefinirem
suas  estratégias  de  acumulação,  donde  o  surgimento  de  novas  estratégias  de
subordinação da periferia ao centro. 
É,  nesse  marco,  que  se  dá  a integração  do  Brasil  à  ordem  econômica  mundial,  nos
anos  iniciais  da  década  de  90,  sob  os  imperativos  do  capital  financeiro  e  do
neoliberalismo,  responsáveis  pela  redefinição  das  estratégias  de  acumulação  e  pela
reforma do Estado. Na prática, isso se traduz em medidas de ajuste econômico e retração
das políticas públicas de proteção social, numa conjuntura de crescimento da pobreza,
do desemprego e do enfraquecimento do movimento sindical, neutralizando, em grande
medida, os avanços e conquistas sociais alcançadas pelas classes trabalhadoras nos anos
80. 
No âmbito do sistema capitalista e da sua economia‐mundo, instala‐se muito mais
do  que  uma  crise  econômica:  estão postas as condições de uma crise orgânica, marcada
pela perda dos referenciais erigidos sob o paradigma do fordismo, do keynesianismo, do
Welfare  State  e  das  grandes  estruturas  sindicais  e  partidárias.  Se,  a  tais  condições  se
soma o exaurimento do “socialismo real”, vê‐se como foi possível afetar a combatividade
do movimento operário, imprimindo, a partir de então, um caráter muito mais defensivo
do que ofensivo às suas lutas sociais.  mundo do trabalho; 2) a ofensiva  ideopolítica necessária  à  construção da hegemonia do
grande capital, evidenciada na emergência de um novo imperialismo e de uma nova fase
do capitalismo, marcada pela acumulação com predomínio rentista (HARVEY, 2004).
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Estes  movimentos  podem  ser  identificados  historicamente  em  medidas  que
indicam: a) a reestruturação dos capitais, com as fusões patrimoniais, a íntima relação
entre  o  capital  industrial  e  financeiro,  além  da  formação  de  oligopólios  globais  via
processos de concentração e centralização do capital; b) as transformações no mundo do
trabalho,  que  tanto  apresentam  mudanças  na  divisão  internacional  do  trabalho  como
redefinem a organização do trabalho coletivo, reduzindo a fronteira entre os processos
de  “subsunção real e formal”  do  trabalho  ao  capital  e  compondo  a  nova  morfologia do
trabalho, segundo a expressão de Antunes (2006); c) a reconfiguração do aparato estatal
e  das  ideologias  e  práticas  que  imprimem  novos  contornos  à  sociabilidade  capitalista,
redefinindo mecanismos ideopolíticos necessários à formação de novos e mais eficientes
consensos hegemônicos.
 
Orquestrada pela ofensiva neoliberal, a ação sociorreguladora do Estado se retrai,
pulverizando os meios de atendimento às necessidades sociais dos trabalhadores entre
organizações privadas mercantis e não‐mercantis, limitando sua responsabilidade social
à segurança pública, à fiscalidade e ao atendimento, através da assistência social, àqueles
absolutamente impossibilitados de vender sua força de trabalho. A classe trabalhadora é
também  atingida  pelos  processos  de  privatização,  inicialmente  através  da  venda  de
empresas  produtivas  estatais,  seguindo‐se  uma  ampla  ofensiva  mercantil  na  área  dos
serviços  sociais  e  de  infra‐estrutura,  tais  como  os  de  saúde,  previdência,  educação,
saneamento,  habitação  etc.,  amparados  pela  liberalização  da  economia,  sob  a  égide  da
liberdade de mercado e retração da intervenção do Estado. 
 
Esse projeto de restauração capitalista, materializado no novo imperialismo, teve
no  “Consenso  de  Washington”  sua  base  doutrinária  e  política,  operacionalizado  pelo
Banco  Mundial,  Fundo  Monetário  Internacional  e  pela  Organização  Mundial  do Comércio, transformado nas principais alavancas institucionais da integração e do ajuste
das economias periféricas às necessidades do capitalismo internacional. 
10
No  novo  imperialismo,  a  hegemonia  vem  sendo  exercida  pelos  Estados  Unidos,
através  do  uso  de  estratégias  que  combinam  coerção  e  consenso,  pretendendo  uma
espécie de governo mundial que, ao sitiar a ideologia dos seus opositores, afirma a sua
(ideologia)  como  universal.  Do  ponto  de  vista  macroeconômico,  em  oposição  à
acumulação  expandida,  que  marcou  boa  parte  do  século  XX,  o  que está  em  processo  de
consolidação  é  a  acumulação  por  espoliação  sob  o  comando  dos  países ricos (HARVEY,
2004; DUMENIL; PETRAS, 2002; LEVY, 2004). 
A marca da acumulação por espoliação tem sido a abertura de mercados em todo o
mundo,  através  das  pressões  exercidas  pelo  Fundo  Monetário  Internacional,  Banco
Mundial  e  Organização  Mundial  do  Comércio  que,  ao  estimularem  a  aplicação  de
excedentes  ociosos  de  capital  –  que  não  encontram  empreendimentos  lucrativos  em
seus  países  de  origem  –,  investem  nos  países  periféricos,  de  onde  jorram  remessas  de
lucros.  Este  processo  torna‐se  campo  de  investimento  transnacional,  desde  o
patenteamento  de  pesquisas  genéticas,  passando  pela  mercantilização  da  natureza,
através do direito de poluir, até a privatização de bens públicos, com a transformação de
serviços  sociais  em  negócios,  implicando  degradação  do  meio  ambiente,  ampla
especulação imobiliária, como vem acontecendo com o litoral do Nordeste, e criação de
nichos produtivos locais, entre outros.
No  âmbito  das  relações  e  dos  processos  de  trabalho,  ocorrem  mudanças
substantivas – seja através da reedição de antigas formas de exploração, como o salário
por  peça,  o  trabalho  em  domicílio  etc.,  transformando,  entre  outros,  os  espaços
domésticos  não  mercantis  em  espaços  produtivos  por  força  das  terceirizações;  seja
instituindo novos processos de trabalho que externalizam e desterritorializam parte do
ciclo produtivo, instaurando novas formas de cooperação, onde se incluem e se ajustam,
num  mesmo  processo  de  trabalho,  atividades  envolvendo  altas  tecnologias,
superespecialização e precarização.  Trata‐se  de  construir um  novo trabalho/trabalhador coletivo  à  base  de  uma  nova
divisão  internacional  e  sociotécnica  do  trabalho,  que  mantém  a  parte  nobre
(planejamento,  projetos,  pesquisa  em  C  &  T,  designers  etc.)  da  produção  nos  países
centrais,  enquanto  transfere  para  os  países  periféricos  o  trabalho sujo e precário,
contando  com  uma  mão‐de‐obra  barata,  a  heterogeneidade  de  regimes  de  trabalho,  a
dispersão espacial e a desproteção dos riscos do trabalho. 
 
Ao contrário do que ocorria no século XX, quando predominavam as concentrações
operárias  numa  mesma  fábrica,  cidade,  região  ou  país  e  se  expandiam  os  sistemas  de
seguridade  social,  o  capitalismo  contemporâneo  prima  por  desterritorializar  o  trabalho
e  as  mercadorias  e  por  precarizar  as  condições  e  relações  de  trabalho,  afetando
sobremaneira as condições de vida dos trabalhadores e a sua capacidade de organização
e resi tência.   s
No  Brasil,  o  processo  de  reestruturação  produtiva  começa  ainda durante a década
de  1980  com  a  informatização  produtiva,  os  programas  de  qualidade total e  a
implantação  de  métodos  de  gestão  participativa.  Segundo  Antunes  (2006,  p.  16),
inicialmente  ela  é  marcada  pela  redução  de  postos  de  trabalho  e  pelo  aumento  da
produtividade  que  dependeram  da  reorganização  da  produção,  da  intensificação  da
jornada de trabalho, do surgimento dos CCQs e dos sistemas de produção just­in­time  e
Kanban. 
11
Nos anos 1990, ela se intensifica sob o influxo da acumulação flexível e do modelo
japonês  –  o  toyotismo  –  quando  a  produtividade  é  potenciada  pela  implantação  de
formas  diversas  de  subcontratação  e  terceirização  da  força  de  trabalho,  além  da
descentralização das unidades de produção, cujas fábricas são transferidas para regiões
sem  tradição  industrial.  De  certa  forma,  essas  mudanças  somente  se  tornam  possíveis
pela ofensividade do capital para construir outra subjetividade do trabalho, implantando
mecanismos  participativos  e  instituindo,  entre  outros,  programas  de  participação  nos lucros ou, ainda, transformando parte dos trabalhadores em acionistas minoritários das
empresas reestruturadas. 
12
Ao contrário dos trabalhadores, cujos coletivos são fragmentados, o capital, através
das  fusões  patrimoniais  transacionais,  aumenta  a  sua  capacidade  de  concentração  e
centralização,  o  que  concorre  tanto  para  um  maior  controle  de  riscos  dos  seus
empreendimentos,  como  para  o  aumento  da  sua  capacidade  de  coordenar  a  produção
mundial.  Para  tanto,  as  corporações  inauguram  novas  formas  de  gerenciamento  e
controle, contando com novas tecnologias de processamento de informações, o que  lhes
permite  conciliar  a  centralização  do  capital  com  a  descentralização  das  operações
financeiras e dos processos de trabalho.
                                                                                                                                                                                           
Mesmo  comportando  formas  diferenciadas,  onde  convivem  setores  tradicionais  e
modernos, relações de trabalho estáveis e precárias e novos processos produtivos que
mesclam  práticas  inspiradas  no  toyotismo  com  práticas  fordistas  e  até  processos  que
remontam à produção simples de mercadoria, essa combinação de padrões produtivos,
segundo  Antunes  (2006,  p.  19),  oferece  como  resultante  um  aumento  da
superexploração do trabalho, traço constitutivo e marcante do capitalismo brasileiro.
A  produção  em  massa  de  produtos  padronizados,  que  marcou  o  regime  fordista,
cede  lugar  à  produção  seletiva, preferencialmente de produtos de luxo, consumida por
não  muito  mais  que  30%  da  população  mundial,  composta  pelas  classes  médias  e
proprietárias.  Torna‐se  inútil para  a  produção  uma  parte  da  população  destituída  dos
meios  de  produção  e  da  condição  de  vendedores  de força  de  trabalho.  Essa  população
excedente,  não  por  acaso,  se  transforma  no  foco  das  políticas  denominadas  de
transferência de renda ou  de  renda mínima e  ingressa,  mesmo  que  residualmente,  nos
mercados consumidores internos. De  igual  modo,  com  o  intuito  de  criar  uma  economia  mundial  baseada  na
intensificação  dos  regimes  de  extração  da  mais‐valia  e  de  barateamento  da  força  de
trabalho,  o  atual  padrão  de  acumulação  capitalista  tem  desenvolvido  mecanismos  de
desvalorização  da força  de  trabalho,  que  visam  incrementar  superlucros  (MARANHÃO,
2006). Trata‐se de um movimento aparentemente contraditório, mas que encerra uma
enorme  funcionalidade,  qual  seja:  o  mesmo  processo  que  determina  a  expulsão  de
trabalhadores  da  produção  intensiva  de  mercadorias  também  ocasiona  a  inserção
precarizada dessa força de trabalho em novos processos combinados de trabalho, cujos
sujeitos são conceituados de trabalhadores informais, temporários ou por conta própria.
Aqui,  os  exemplos  mais  emblemáticos  são  o  da  produção  de  mercadorias  à  base  da
reciclagem  de  materiais,  cujos  vendedores  de  matéria‐prima,  os  denominados
“catadores  de  lixo”,  integram  a  cadeia  produtiva  da  reciclagem;  os  trabalhadores  e
pequenos produtores rurais que fornecem matéria‐prima para a produção do biodiesel e
as mulheres que costuram por facção para a indústria de confecção, cujo trabalho é pago
por peça. 
13
Esses trabalhadores e trabalhadoras, em tese, integram a superpopulação flutuante
e estagnada a que se referiu Marx ao tratar sobre Lei Geral da Acumulação (MARX), cuja
função econômica é empurrar os salários dos trabalhadores ativos para baixo. Contudo,
na atualidade, essa superpopulação é refuncionalizada, transformando‐se em peça chave
da  acumulação por espoliação.  Nessa  dinâmica,  os  países  periféricos  têm  se
transformado em imensos reservatórios de força de trabalho barata  e  precária  para  as
megacorporações transnacionais. 
Neste processo, deve‐se destacar a financeirização da economia, na base da qual se
encontra a orgânica vinculação entre as grandes corporações produtivas transacionais e
as  instituições  financeiras  que  passam  a  comandar  a  acumulação,  contando  para  isso
com  a  desregulamentação  operada  pelo  Estado  através  da  liberalização  dos  mercados.
Embora  se  apresente  como  uma  forma  “autônoma”  de  produção  da  riqueza,  o  que  é
impossível  no  modo  capitalista  de  produção,  baseado  na  produção  da  mais‐valia,  o capital financeiro, de forma inaudita, além de potenciar o fetichismo da mercadoria, cria
outro fetiche: o de que dinheiro se transforma em capital prescindido da base material
riginada na e pela produção capitalista, através da exploração do trabalho pelo capital. 
14
Nesse  quadro,  uma  das  maiores  perdas  para  os  trabalhadores  foi  o
comprometimento  do  seu  potencial  político‐organizativo.  Este  comprometimento  se
deveu  a  diversos  fatores,  entre  eles,  as  novas  práticas  de  gestão  da  força  de  trabalho,
cujas expressões mais visíveis foram a “cultura” participativa inaugurada com os CCQs e
as  modalidades  de  externalização  de  parte  dos  processos  de  trabalho  através  das
o
3 Implicações na organização política dos trabalhadores
É  inegável  que  as  transformações  operadas  no  interior  da  produção  capitalista,
desde  os  finais  dos  anos  1970,  operaram  mudanças  radicais  e  substantivas  nos
processos e nas condições de trabalho de milhares de trabalhadores em todo o mundo.
Inicialmente atingiram as economias centrais e posteriormente se espraiaram nos países
periféricos,  onde  se  inclui  o  Brasil,  produzindo  um  cenário  no  qual  convivem  a
acumulação  e  concentração  da  riqueza  com  a  ampliação  do  desemprego,  a  precarização
do trabalho e o agravamento da pobreza. 
A ofensiva político‐social e ideológica para assegurar a reprodução deste processo,
como já referido, passa pela chamada reforma do Estado e pela redefinição de iniciativas
que devem ser formadoras de cultura e sociabilidade, imprescindíveis à gestação de uma
reforma  intelectual  e  moral  (MOTA,  2000)  conduzida  pela  burguesia  para  estabelecer
novos parâmetros na relação entre o capital, o trabalho e destes com o Estado. 
Amparada  pela  naturalização  da  mercantilização  da  vida,  essa  reforma  social  e
moral  busca,  entre  outros  objetivos,  transformar  o  cidadão  sujeito  de  direitos  num
cidadão‐consumidor;  o  trabalhador  num  empreendedor;  o  desempregado  num  cliente
da  assistência  social;  e  a  classe  trabalhadora  em  sócia  dos  grandes  negócios  (MOTA,
2006).  terceirizações,  da  compra  de  serviços,  do  trabalho  em  domicílio,  por  tarefa,  etc.
Enquanto o participacionismo alimentava a passivização do trabalhador nos seus locais
de  trabalho,  os  mecanismos  de  externalização  imprimiam  novos  meios  de  controle  e
dominação  sob  o  argumento  da  autonomia  do  trabalhador  por  conta  própria  e  da
ideologia da  empregabilidade. Outro  fator preponderante foi a  desterritorialização  das
firmas  que,  ao  dispersar  as  concentrações  operárias,  esgarçaram  as  condições
necessárias à organização dos trabalhadores nos seus locais de trabalho e nos sindicatos
por categoria profissional. 
15
A  estas  práticas  acrescenta‐se  a  progressiva  expansão  do  exército  industrial  de
reserva,  cuja  formação  seja  consubstanciada  por  desempregados  temporários  ou
permanentes  engrossa  as  fileiras  da  força  de  trabalho  disponível  e  disposta  a  assumir
qualquer  tipo  de  emprego,  o  que  favorece  o  rebaixamento  salarial  e  possibilidades
inima náveis de precarização.   gi
   
Todas  estas  situações  afetam  a  composição  da  classe  trabalhadora,  inclusive  ao
gerar  impactos  diferenciados  nos  jovens,  nas  mulheres  e  trabalhadores  qualificados  e
não  qualificados,  resultando  numa  grande  diversidade  de  questões  e  interesses  que
rebatem nas motivações e prioridades das suas lutas. O ambiente político deste processo
é representado pela desestruturação do mercado de trabalho, tanto pela flexibilização da
produção quanto pela da gestão das relações produtivas, introduzindo novas formas de
contrato  de  trabalho  e  criando  um  mosaico  de  situações  jurídicas  e  profissionais  que
tornam  menos  visíveis  os  laços  de  classe  existentes  entre  os  trabalhadores,  além  de
fragilizar o núcleo do trabalho estável e organizado (SANTOS, 2006, p. 450). 
Contudo, apesar dessa desmontagem da prática organizativa dos trabalhadores, é
possível  identificar  a  existência  de  movimentos  de  resistência  e  de  defesa  de  direitos
conquistados  que,  mesmo  recorrentemente  ameaçados  e  desqualificados  pelas  classes
dominantes e pela burocracia sindical, como está acontecendo no Brasil, vêm obrigando
o governo a fazer negociações e a produzir recuos no legislativo.  Os  resultados  políticos  da  ofensividade  das  classes  dominantes  têm  sido  a
fragmentação  dos  interesses  classistas  dos  trabalhadores  e  a  proliferação  de
movimentos  sociais  “extraeconômicos”  e  “transclassistas”.  Ao  mesmo  tempo  em  que  a
burguesia consegue articular e agregar os interesses dos capitais de todas as partes do
mundo, fragmenta as identidades e necessidades daqueles que vivem do seu trabalho. As
consequências  dessa  fragmentação  na  composição  e  ação  política  das  classes
trabalhadoras resultam num processo de passivização da suas lutas.
16
 
Como  a  história  não  acabou,  é  importante  enfatizar  que  o  que  está  em  jogo  é  a
capacidade  das  classes  subalternas  desmontarem  o  projeto  e  as  práticas  das  classes
 
Em certa medida, as lutas sociais – apesar de presentes em todo o cenário mundial
(HOUTART; POLET, 2003; LEHER; SETÚBAL, 2005; PETRAS, 2000) – perdem  força  com
a  fragilização  do  movimento  operário,  que,  ao  adquirir  um  caráter  de  resistência,  tem
baixa incidência nas questões afetas às relações e processos de trabalho. 
O  andamento  dessas  práticas  demonstra  a  imperiosa  necessidade  de  uma
articulação  global  que  conduza  o  movimento  sindical  a  adotar  estratégias  políticas
globais  através  de  uma  articulação  orgânica  com  os  movimentos  sociais  e  as  lutas
espontâneas das classes subalternas contra a lógica do capital. 
Malgrado a condição defensiva da classe trabalhadora, presencia‐se uma ampliação
das  lutas  sociais  mundiais,  consoantes  com a  ofensiva financeira mundializada,  de  que
são exemplos o Fórum Mundial das Alternativas realizado no marco da reunião de Davos
em 1999 e iniciativas em redes como a Ação para Tributação das Transações Financeiras
em  Apoio  aos  Cidadãos  (ATTAC);  o  movimento  em  defesa  da  cobrança  da  Taxa Tobin,
que  propõe  taxar  em  1%  as  transações  especulativas  nos  mercados  de  divisas;  a
Coordenação Contra os Clones do Acordo Multilateral sobre o Investimento (CCCAMI);
além  do  projeto  Alternativa  Bolivariana  para  América  Latina  e  Caribe  (ALBA),  em
contraposição  ao  projeto  comercial  da  ALCA,  abraçada  por  setores  da  esquerda
Latinoamericana e Caribenha. dominantes  ao  tempo  em  que  constroem  o  seu  projeto  –  radicalmente anticapitalista e
em defesa de uma sociedade para além do capital. 
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