O Começo da Revolução na Rússia
V. I. Lénine
25 (12) de Janeiro de 1905
Transcrição autorizada |
Escrito: em Genebra, 25 (12) de janeiro de 1905.
Primeira edição: Vperiod, n.° 4, 31 (18) de Janeiro de 1905. Fonte: Obras Escolhidas em Três Tomos, 1977, Edições Avante! - Lisboa, Edições Progresso - Moscovo
Tradução: Edições "Avante!" com base nas Obras Completas de V. I. Lénine, 5.ª ed. em russo, t. 9, pp. 201-204.
Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Editorial "Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo, 1977.
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Genebra, quarta-feira 25 (12) de Janeiro.
Na Rússia estão a dar-se grandiosos acontecimentos históricos. O proletariado ergueu-se contra o tsarismo. O proletariado foi levado à insurreição pelo governo. Agora dificilmente são possíveis dúvidas de que o governo, deliberadamente, deixou que se desenvolvesse com relativa liberdade o movimento grevista e se iniciasse uma ampla manifestação com o desejo de levar as coisas até ao emprego da força armada. E levou-as! Milhares de mortos e feridos — tal é o balanço do domingo sangrento de 9 de Janeiro em Petersburgo[N227]. A tropa venceu os operários, as mulheres e as crianças desarmados. A tropa venceu o inimigo, metralhando os operários que jaziam por terra. «Demos-lhes uma boa lição!» —dizem agora com incrível cinismo os servidores do tsar e os seus lacaios europeus da burguesia conservadora.
Sim, a lição foi grande! O proletariado russo não esquecerá esta lição. As camadas menos preparadas e mais atrasadas da classe operária, que acreditavam ingenuamente no tsar e desejavam com sinceridade entregar pacificamente «ao próprio tsar» as reivindicações do martirizado povo, todas elas receberam uma lição da força militar dirigida pelo tsar ou pelo tio do tsar, o grão-duque Vladímir.
A classe operária recebeu uma grande lição de guerra civil; a educação revolucionária do proletariado avançou num dia como não poderia avançar em meses e anos de vida cinzenta, enfadonha e oprimida. A palavra de ordem do heróico proletariado de Petersburgo «morte ou liberdade!» ecoa agora em toda a Rússia. Os acontecimentos desenrolam-se com uma rapidez surpreendente. A greve geral em Petersburgo cresce. Toda a vida industrial, social e política está paralisada. Na segunda-feira 10 de Janeiro, os choques entre os operários e a tropa tornam-se mais encarniçados. Contrariamente aos enganosos comunicados governamentais, o sangue corre em muitas e muitas partes da capital. Erguem-se os operários de Kólpino. O proletariado arma-se e arma o povo. Os operários apoderam-se, segundo se diz, do depósito de armas de Sestroretsk. Os operários munem-se de revólveres, forjam armas das suas próprias ferramentas, conseguem bombas para a desesperada luta pela liberdade. A greve geral estende-se às províncias. Em Moscovo, 10 000 pessoas já abandonaram o trabalho. Está marcada para amanhã (quinta-feira 13 de Janeiro) a greve geral em Moscovo. Rebentou uma revolta em Riga. Manifestam-se os operários de Lodz, prepara-se a insurreição de Varsóvia e realizam-se manifestações do proletariado em Helsingfors. Em Bakú, Odessa, Kíev, Khárkov, Kovno e Vilno cresce a efervescência entre os operários e amplia-se a greve. Em Sebastopol ardem os depósitos e o arsenal do departamento da marinha, e a tropa nega-se a abrir fogo contra os marinheiros sublevados. Greve em Revel e em Sarátov. Choque armado entre a tropa e os operários e reservistas em Radom.
A revolução estende-se. O governo começa já a perder a cabeça. Da política de repressão sangrenta tenta passar a concessões económicas e escapar-se com a esmola ou a promessa da jornada de trabalho de nove horas. Mas a lição do sangrento dia não poderá ser em vão. A reivindicação dos operários insurrectos de Petersburgo — a imediata convocação da Assembleia Constituinte eleita por sufrágio universal, directo, igual e secreto — deve tornar-se a reivindicação de todos os operários em greve. Derrubamento imediato do governo — tal é a palavra de ordem com a qual mesmo os operários de Petersburgo que acreditavam no tsar responderam à carnificina de 9 de Janeiro pela boca do seu dirigente, o sacerdote Gueórgui Gapone, que, depois deste dia sangrento, disse: «Já não temos tsar. Um rio de sangue separa o tsar do povo. Viva a luta pela liberdade!»
Viva o proletariado revolucionário! — dizemos nós. A greve geral ergue e mobiliza massas cada vez mais amplas da classe operária e dos pobres das cidades. Armar o povo converte-se numa das tarefas imediatas deste momento revolucionário.
Só o povo armado pode ser um verdadeiro baluarte da liberdade popular. E quanto mais depressa o proletariado conseguir armar-se, quanto mais tempo se mantiver na sua posição de combate de grevista revolucionário, tanto mais depressa a tropa vacilará e tanto maior será o número de soldados que compreenderão, por fim, o que estão a fazer, que passarão para o lado do povo contra os verdugos, contra o tirano, contra os assassinos dos operários desarmados, das suas mulheres e dos seus filhos. Qualquer que seja o desenlace da actual insurreição no próprio Petersburgo, em todos os casos ela tornar-se-á inevitável e inelutavelmente o primeiro degrau para uma insurreição ainda mais ampla, mais consciente e mais preparada. O governo conseguirá talvez adiar a hora do ajuste de contas, mas o adiamento apenas tornará ainda mais grandioso o passo seguinte da ofensiva revolucionária. O adiamento só servirá à social-democracia para unir as fileiras dos combatentes organizados e para difundir notícias sobre a iniciativa dos operários de Petersburgo. O proletariado aderirá à luta, abandonando as fábricas e as empresas e preparando o seu próprio armamento. Entre os pobres das cidades, entre os milhões de camponeses espalhar-se-ão cada vez mais amplamente as palavras de ordem de luta pela liberdade. Formar-se-ão comités revolucionários em cada fábrica, em cada bairro da cidade e aldeia importante. O povo insurrecto lançar-se-á ao derrubamento de todas e quaisquer instituições governamentais da autocracia tsarista, proclamando a convocação imediata da assembleia constituinte.
O armamento imediato dos operários e de todos os cidadãos em geral, a preparação e organização das forças revolucionárias para a liquidação das autoridades e instituições governamentais — esta é a base prática sobre a qual podem e devem unir-se todos os revolucionários sem distinções para o golpe comum. O proletariado deve seguir sempre o seu caminho independente, sem enfraquecer a sua ligação com o partido social-democrata e tendo presentes os seus grandes objectivos finais, a libertação da humanidade inteira de toda a exploração. Mas esta independência do partido proletário social-democrata nunca nos poderá levar ao esquecimento da importância da arremetida revolucionária comum no momento da actual revolução. Nós, sociais-democratas, podemos e devemos marchar independentemente dos revolucionários da democracia burguesa, guardando a independência de classe do proletariado, mas devemos marchar ombro com ombro durante a insurreição, ao desferir golpes directos ao tsarismo, ao fazer frente à tropa, ao assaltar as bastilhas do inimigo maldito de todo o povo russo.
O proletariado do mundo inteiro volta agora os seus olhos com febril impaciência para o proletariado de toda a Rússia. O derrubamento do tsarismo na Rússia, iniciado heroicamente pela nossa classe operária, será um ponto de viragem na história de todos os países, tornará mais leve a tarefa de todos os operários de todas as nações, em todos os Estados e em todos os pontos do globo terrestre. E que cada social-democrata, que cada operário consciente se lembre das grandiosas tarefas da luta de todo o povo que repousam agora nos seus ombros. Que não se esqueça que representa as necessidades e os interesses também de todo o campesinato, de toda a massa de trabalhadores e explorados, de todo o povo, contra o inimigo comum. Todos têm agora diante dos olhos o exemplo dos heróicos proletários de Petersburgo.
Viva a revolução!
Viva o proletariado insurrecto!
Notas de fim de Tomo:
[N227] Em 9 de Janeiro de 1905 foi metralhada por ordem do tsar uma manifestação pacífica dos operários de Petersburgo, que, encabeçados pelo padre Gapone, se dirigiam para o Palácio de Inverno para entregar uma petição ao tsar. Em resposta a esta selvática acção repressiva contra operários desarmados, em toda a Rússia rebentaram greves políticas de massas e manifestações sob a palavra de ordem de «Abaixo a autocracia!». Os acontecimentos de 9 de janeiro deram início à revolução de 1905-1907. (retornar ao texto)
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